sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

O último 10.

Resolvi escrever e nem sei bem o quê. Nesse diário de palavras mal escritas e cuspidas sem começo nem fim. Escreverei porque a primeira década dos anos 2000 acabou. E levou com ela partes de mim. Boas e ruins. Transformei-me em 10 anos. Envelheci 10 anos, ou mais, quem sabe?! Escrevo porque ano novo é sinônimo de novas promessas e novas experiências. Experiências que vou viver. E vou. E quero e procuro-as. Quero novos sorrisos e novas ideias. Quero novos sabores cores dolores... Quero tangos e sambas. Quero sen-timentos-sações. Quero neologismos e neoamores. Quero neoconhecimento. Quero neo. Novos. Quer 11. 12. 13. 14. Quero tanto. Basta-me buscá-los. E fazê-lo-ei. Quero gramática. Línguas. Corpúsculos. Ósculos. Vem, vem comigo no embalo do new year. Let it be, darling...

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Deixa-me ser-te.

Enquanto sua cabeça repousava no chão e os olhos perdiam-se na imensidão vasta daquelas luzes, lembrou-se da história. A história de uma nega, bem nega, tomada de escuridão por todos os lados, exceto dentro dela. Repetia sempre enquanto descoloria os cabelos pretos como carvão que era negra sim, nas só por fora, por dentro era uma branca donzela e loira, que casaria com um lord e arredaria desse país, iria para a Suiça, porque ouvira que lá todos eram bem brancos e loiros e ricos e educados. Então a nega secou os cabelos (loiríssimos, diga-se de passagem!) e resolveu aparecer pelo samba de gafiera (não, não é cultura afro não, é cultura brasileira, é bonito!) porque era uma mulata que sambava bonito. E foi lá que seus olhos encontraram um lord. Bem branco e loiro e rico e educado, soara pela cabeça, agora loira, da nega. E o bendito do branquelo sambava bonito, requebrava nas calças brancas e o corpo movia-se como uma serpente sob a blusa listrada branca e azul branca e azul branca e azul como os olhos, cobertos pela aba do chapéu panamá, todo malandro. E os olhos arregalavam-se porque o branco sambava melhor que muito negro por ali. E ele sabia disso e ele queria isso e ele era negro por dentro sim senhor, de branco só tinha a pele porque deus é injusto. Repetia isso sempre enquanto preparava a feijoada (prato típico dos escravos, orgulho da cultura afro!) e queria casar com uma mulata que sambasse bonito e tivesse os cabelos ruins, bem pixaim, dizia ele. E foi lá , samba suor e cerveja que encontrou pernas queimadas desnudas e um colo queimado desnudo e um sorriso branco e largo e suado e cabelos loiros. E riu-se por dentro. E desejou aquela nega loira. E tocou-a e trouxe-a para junto do peito branco e ela se entregou porque desejava aquele branco nego. E no beijo eterno de ambos transferiram as almas, ela a nega de nascença e ele a branca de origem e era contrários e amantes. Amantes contrários que não queriam o que o outro sempre quis. Não queriam o que eram e sim o não-querer do companheiro. E deram certo assim porque a admiração era infinita. Porque sempre se quer o que não se pode ter.
O primeiro contato deve-se ao meio moderno de comunicação. Falaram-se pela internet e identificaram-se. Conheceram-se. Beijaram-se. E nasceu ali o amor. O Amor incrível e racional de dois cérebros. Cérebros apaixonados é uma situação dificílima, ela sabia disso mas não sabia se ele sabia disso. Os cérebros se amavam porque eram compatíveis, as sinapses começavam em um deles e acabava nos receptores do outro que neurotransmitiam-nas para o outro e assim criava-se uma cadeia de pensamento-transmissão-neurônio-sentimental. Amavam-se. O cérebro dela desejava o dele, queria-o toda hora (60 minutos, 3600 segundos, fórmulas, matemática). O pensamento nunca concentrava-se apenas nos dois. Porque era amor racional e amor racional bate no hemisfério esquerdo. Ela queria amá-lo também com o direito. E com o coração. E com o resto do corpo todo. Mas acabara assim. Dois cérebros apaixonados... Sem corações partidos.